segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

AMIGO SECRETO EM CASA

(publicado em 20/12/2006)

Em casa, 2006 foi um dos anos mais gostosos de nossas vidas: comemos, bebemos e respiramos arte. Foi um verdadeiro desfile de atores, atrizes, bailarinos, bailarinas, diretores e diretoras de teatro, músicos e músicas, cenógrafos, iluminadores, enfim, muita gente boa.

Talvez por isso, o “amigo secreto” da casa foi todo apoiado em arte. Decidimos, Lisa, as cadelas Samba e Salsa, o casal de sacis Maracatu e Lambada, e eu, que faríamos o “amigo secreto”, mas os presentes seriam performances artísticas: cada um deveria estudar a personalidade do sorteado e produzir uma performance baseada nisso.

No final de outubro, fizemos o sorteio. Aliás, vários sorteios, porque, como somos apenas seis, muitas vezes alguém tirava ele mesmo. Por fim, deu certo. A partir dali, passamos à fase dos ensaios, o que foi um sufoco, já que tínhamos que esconder o que estávamos produzindo pra que ninguém descobrisse o amigo do outro.

A Samba foi quem organizou a parte dos contatos através de bilhetes. Mas, como é curiosa aquela cadela! Ela tentou o tempo todo saber quem havia tirado quem. Não conseguiu, mas foi uma correria danada pra despistá-la.

A Salsa, sempre muito séria, cansou de dar dura na Samba. “É por você ser assim, que o carteiro tem chegado em silêncio na nossa rua. Você vive querendo abrir as correspondências dos vizinhos!”, dizia a Salsa.

Maracatu e Lambada, prepararam suas performances fora de casa, provavelmente de madrugada.

Eu ensaiei com fone de ouvido durante as tardes, enquanto as cadelas dormiam e a Lisa ficava na Estação Ferroviária ensaiando teatro. A Lisa preparou seu número lá na Estação mesmo.

Na revelação, que ocorreu antes do Natal, decidimos que a pessoa apresentaria sua performance e todos tentariam adivinhar quem ela havia tirado.

Preparamos a mesa na varanda com muita fruta para os sacis; ração comum e diet, porque a Salsa passou um pouco do peso; salgados e bebidas.

Samba não se cabia em sua excitação e continuava dando as ordens para preparar as revelações.

Chegado o momento, Samba disse que não queria ser a primeira e pediu que a Lisa iniciasse.

A Lisa subiu no palco improvisado e fez um número de dança contemporânea, com trilha de Zé Gomes e contando uma história de uma menina que vivia num orfanato e que acabou encontrando uma família. Nos primeiros passos, Samba já estava chorando, afinal, aquela era sua história, mas a Lisa havia tirado a Salsa e esta ficou muito orgulhosa.

Salsa foi ao palco e reproduziu um trecho do filme “Policarpo Quaresma”. Ficou na cara que ela havia me tirado.

De onde eu estava, disse uma poesia de Vinícius de Moraes, que fala de nossa brasilidade. Ficou a dúvida se eu havia tirado Maracatu ou Lambada, mas Salsa lembrou-se da obsessão de Vinícius pelas mulheres e descobriu que era a Lambada.

Lambada fez um número de ballet clássico, em cima de uma trilha que, em meio a Vivaldi, surgiam textos muito românticos ditos por ela. Todos acertaram que ela havia tirado o Maracatu.

Maracatu surpreendeu a todos, mesmo restando apenas a Lisa e a Samba. Ele foi à lavanderia e voltou com uma imensa peruca negra na cabeça e um vestido longo azul brilhante. Colocou Tina Turner pra tocar e fez um número de dublagem, numa dança muito frenética. A performance encaixava tanto para a Lisa, quanto para a Samba, e a dúvida ficou por um tempo, até que ele foi obrigado a revelar que havia tirado a Samba.

Samba, já subiu ao palco chorando e falou de sua felicidade em ter tirado a Lisa, mas queria fazer uma homenagem para nós dois, Lisa e eu, em sua performance. Ajeitou o pedestal e o microfone, sentou num banquinho, cruzou as pernas, soltou o play back e cantou, afinadíssima, a música “Lisa”, que compus em parceria com Lula Barbosa.

Ao final, nos abraçamos e brindamos pela continuidade desse clima de arte, por muitos e muitos anos, em nossa casa.

João Bid

Nenhum comentário:

Postar um comentário