quinta-feira, 11 de novembro de 2010

VENCENDO PRECONCEITOS

Fiquei um tempo sem relatar as conversas de casa, porque as conversas rarearam mesmo, já que algumas coisas chatas aconteceram com a gente.
Perdemos o amigo, o irmão, o parceiro musical, enfim, a pessoa maravilhosa, que era o Abelardo, o Abê, que além de cantar no Catavento comigo, é um grande artista plástico. Aliás, o Abê cantava e tocava seus instrumentos com o mesmo cuidado que pintava; assim como, pintava seus quadros com a mesma intensidade com que interpretava uma canção. Já havíamos perdido José Saramago, escritor que inspira nosso cotidiano. E, na sequência, a Salsa, a cadela mais gorda e peluda, a mais tímida e séria, está com diabetes e, por conseqüência da doença, ficou cega.
Por tudo isso, os dias ficaram mais silenciosos nesses últimos meses. Todos respeitando a forma e o tamanho com que a dor se apresentou em cada um de nós.
Um fato novo trouxe um pouco de alegria para a casa e a chance das conversas voltarem a fluir. Não tenho dúvidas que Abê e Saramago também se alegraram com esse fato. Dilma ganhou as eleições e logo no dia seguinte as coisas já estavam diferentes.  
“Cala a boca, Tom!!!”, ouvi, quando estava no corredor interno da casa, me dirigindo à cozinha. A fala vinha do corredor externo. Abri a janela que dá para a garagem e vi a Samba rindo de pernas pro ar e aproveitando para coçar às costas, com movimentos que, se juntando ao riso, criavam uma espécie de performance pós moderna. Realmente bacana.
Perguntei o que estava ocorrendo e a Samba, entre risos, disse-me que a Salsa estava fazendo ameaças ao Tom, o gato, invocando até a vitória da Dilma para isso.
Abro um parêntese para falar um pouco sobre a situação da Salsa. Somente agora ela está mais habituada com o espaço que deve explorar sem a visão, mas, no começo, ela andava batendo a cabeça, indo para o lado errado, o que nos deixava chateados. Com o tempo, a Salsa mesmo foi nos deixando mais à vontade, se permitindo, até, brincar com a situação. “No começo a gente acha que o mundo acabou, mas, depois, a adaptação é natural e você acaba descobrindo coisas tão belas quanto aquelas que você pode enxergar. Aliás, que você pode ver; porque você somente consegue chegar o mais próximo de enxergar de verdade, quando já não pode mais ver.”, filosofou a Salsa, um belo dia. Digo um belo dia, porque, a partir dali, ficamos mais à vontade para conversar com ela, sem achar que a cadela ficou sem algo, mas sim, pensando que ela ganhou algo, que nós não conseguimos imaginar. Algo que pode, até, ser melhor. “Hoje, tenho mais tempo pra ficar comigo,” concluiu a cadela.
Então, voltando ao dia seguinte da vitória da Dilma, a Salsa entrava no corredor para se dirigir ao quartinho do fundo do quintal e o Tom, da janela da cozinha, dirigindo seus passos, mas, obviamente, apontando para direções erradas, criando armadilhas para os passos da Salsa. “Vem pra esquerda!”, orientou o Tom, e a Salsa derrubou a vassoura, que estava encostada na porta da cozinha. “Mais pra direita!”, ajudou o gato, e a pata da cadela mergulhou na vasilha de água; “Segue em frente”, incentivou o Tom, e a cabeça da Salsa parou no botijão de gás.
Foi aí, que a Salsa gritou: “Cala a boca, Tom!!!, Cuide da sua vida! Aliás, cuide bem da sua vida, porque, agora, quem manda aqui são as mulheres. Você vai experimentar o toque feminino, seu gato safado. E cuidado ao passar perto de mim, pois meu faro está mais aguçado e posso te dar um bote muito mais certeiro agora.” “É Dilma lá e nós aqui”, alfinetou a cadelinha Valsa.
“As mulheres vão dar um toque feminino e folclórico no governo, já que a vitória da Dilma se deu no dia em que o Brasil comemora o Dia do Saci.”, lembrou a saci Lambada, com quem, concordou o saci Maracatu. “É! Isso é motivo de muito orgulho para nós.”
Como estávamos no meio do feriado, reservei aquela tarde para cortar a grama do quintal.
Estava eu arrancando tiriricas, com Samba e Valsa à minha volta e Salsa um pouco mais distante, quando vejo que o Tom se aproximava. Embora a convivência entre cães e gato tenha melhorado lá em casa, ainda me preocupo quando eu e a Lisa estamos próximos dos animais. Ainda tenho medo que o ciúme faça com que as cadelas ataquem o Tom. Mas... o Tom se aproximava e estava para passar na frente da Salsa. Lembrei que a Salsa havia prometido um bote certeiro e fiquei preocupado. Agora, o Tom estava com a metade do corpo em frente à Salsa e notei que ela farejava pra determinar a distância. O rabo dele iria encostar no nariz dela e o rabo dela começava a balançar. Fixei os olhos naquela direção, pronto para evitar o pior, quando o rabo do Tom tocou, de fato, o nariz da Salsa. Quis fechar os olhos, mas resisti e não o fiz. Nesse momento, a Salsa respirou fundo, abriu um sorriso, coisa rara naquela cadela, e, não tenho dúvida, se sentiu um degrau acima na sua evolução enquanto ser, quase humano.
Ali, percebi que o governo Dilma Roussef começava a se desenhar. Os preconceitos estão sendo vencidos e os seres terão mais chances de se entenderem melhor.
Arrepiei, porque, concomitantemente ao ocorrido, dois raios de sol se espremeram entre as nuvens carregadas e, por um breve instante, iluminaram o quintal.
O sol se foi em seguida, deixando uma brisa e a certeza de que Abê e Saramago estavam passando por ali e também curtiram aquele momento de grandeza da Salsa. Vencer os preconceitos sempre foi um dos ideais dos dois.   
     
      João Bid

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

UM PROTESTO SEM RODEIOS

“Eu odeio rodeio!!!” Acordei com esse grito. O relógio marcava duas horas da manhã. “Eu odeio rodeio mais que tudo nesse mundo!!!”. Levantei e olhei pela fresta da janela do quarto. “Eu odeio rodeio mais do que o cachorrinho do vizinho que vem fazer xixi no portão da nossa casa!!!.

Pela ordem, estavam gritando: Salsa, Samba e Valsa.

Em casa, o quintal é gramado e para passar da casa para a lavanderia, onde fica também o quartinho das meninas, fizemos uma passarela em forma de “Y”, com duas pernas, que saem dos corredores laterais da casa, se encontrando com uma terceira que leva à lavanderia e formando no centro uma circunferência, onde também se vê um símbolo yin e yang ladrilhado.

E foi um “desfile-protesto” que vi pela fresta da janela na passarela que já descrevi.

As meninas vinham, uma de cada ponto da passarela, se encontravam no meio e saiam para os lados opostos, sempre gritando palavras de ordem contra o rodeio, que iniciara naquela noite em Mairinque. A música que vinha da festa estava no último volume e, no silêncio da madrugada, parecia insuportável, por isso, elas estavam usando fone de ouvido, que pegaram nas minhas bagunças.

“Eu odeio rodeio mais do que político corrupto!!!”, gritou a Samba. “Eu odeio rodeio mais do que o inventor dos fogos de artifícios!!!”, gritou a Salsa. “Eu odeio rodeio mais do que o inventor da Barbie, aquela boneca horrorosa!!!”, gritou a Valsa.

Samba e Salsa, mais velhas, estavam levando a sério o movimento. Mesmo a Samba, que vive sorrindo, estava com a cara fechada. Mas Valsa, a cadelinha, estava mesmo era gostando da farra. Feliz por estar acordada fazendo bagunça àquela hora com a autorização das mais velhas.

Resolvi não intervir, por dois motivos. Primeiro, porque a Lisa, que também não conseguia dormir e estava na sala de televisão assistindo a um filme, com o volume bem alto para não ouvir a música da festa, não tinha percebido, mas se percebesse, ficaria muito brava, pois as meninas, além do fone de ouvido, trajavam roupas dos figurinos das peças teatrais dela, que ficam em baús no quartinho. E depois, porque o movimento não estava incomodando a vizinhança, já que abafado pela música.

Mais ou menos duas e meia a música parou e, alguns minutos depois, chegou o casal de sacis Maracatu e Lambada. “Vocês agiram novamente?”, perguntou a Salsa, com um sorriso sarcástico no canto da boca. “Não! Desta vez não conseguimos desligar o som.”, respondeu Maracatu. “A música parou porque o rodeio estava vazio.”, contou Lambada. “E por que vocês ficaram até o fim?”, perguntou a Valsa. “Porque estava muito divertido.”, respondeu Lambada.

Samba interveio. “O que? Vão me dizer, agora, que vocês gostam de rodeio?”, disse a cadela completamente indignada. “Não, pelo amor dos seres folclóricos!!!”, disse Lambada. “Então, vocês gostam de música sertaneja?”, interrogou Samba. “Calma Samba! Também detestamos música sertaneja. Nos divertimos, porque ficamos derrubando os peões, soltando aquela corda que aperta a virilha dos animais.”, disse, sorrindo, Maracatu. “Eu joguei um mosquito na garganta do locutor, que ele engasgou bem na hora que ia dizer: ‘Seguuuura peão!’”, relatou Lambada, já caindo na gargalhada. Gargalhada que se espalhou entre as cadelas. “Teve um momento que fiquei preocupado. Derrubei o peão, que montava um touro, e quase ele toma uma cifrada. Precisei conversar com o touro.”, revelou Maracatu. “E com cantor, o que aprontaram?”, perguntou Samba. “Com ele nada, mesmo porque ele é apenas uma marionete na mão do empresário. Apenas desafinamos as cordas da guitarra e do banjo e fizemos o baterista cair do banquinho. Mas, com o empresário foi muito divertido.”, disse Lambada. “Conta!”, pediu Valsa, feliz da vida. “Entramos no camarim e esperamos que ele recebesse o cachê do show. Como era muito dinheiro, ele dividiu o pacote e distribuiu nos bolsos da calça. O Maracatu puxava o pacote de um bolso e eu puxava do outro. E choramos de rir ao ver o cara de quatro no chão, recolhendo nota por nota.” “Então, estamos vingadas.”, disse Samba.

Como percebi que o clima estava bem tranquilo e que eles conversavam em volume baixo, fui para a cama, empurrei o Tom um pouco mais para o canto e dormi, mas não sem antes desejar que Maracatu e Lambada tivessem mais sorte no outro dia e conseguissem desligar o som do rodeio. Assim, teríamos um pouco de paz na próxima madrugada.

João Bid

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

JINGLES DE CAMPANHAS ELEITORAIS. FALTA CRIATIVIDADE

Agora não somos mais acordados pelos bucólicos sinos da igreja nas manhãs de domingo. É que moramos na Vila Sorocabana, em Mairinque, onde, aos domingos, acontecem as feiras livres e, com a campanha eleitoral, a concentração de cabos eleitorais nas proximidades da minha casa é enorme, todos buscando votos para seus candidatos junto aos clientes da feira. Com eles, inúmeros carros de som tocando ao mesmo tempo, e em volume exagerado para um domingo de manhã, os jingles de campanha. Verdadeiras pérolas. Eu e Lisa conhecemos todos e esses candidatos conseguiram, além de perder nossos votos, nutrir um sentimento no mínimo esquisito, que não podemos chamar de admiração.

Os jingles já foram mais interessantes em outras épocas, mas hoje, talvez por uma espécie de aculturação visível e audível, viraram retalhos de músicas de mau gosto, que irritam até os fiéis que se dirigem às missas tão contritos e de alma, teoricamente, limpa.

Uma vez, o Pisca, meu amigo, que cozinha maravilhosamente bem, me segredou, depois de receber um elogio meu pela comida que havia feito: “João, a gente mistura um monte de coisa boa e não tem como ficar ruim”. Mal comparando, digo que os atuais jingles são uma mistura de um monte de coisa ruim, que nunca poderiam ficar bons.

Neste último domingo, pra variar, fomos obrigados a levantar cedo. A Lisa levantou antes e, quando sai do quarto, ela estava no final do corredor me fazendo sinal de silêncio e apontando para fora da casa. Fomos nas pontas dos pés até a janela e vimos Maracatu e Lambada, os sacis, sentados na estrutura de ferro que sustenta a lona de cobertura da garagem; Tom, o gato, em cima de um dos pilares do portão; Samba e Salsa, as cadelas mais velhas, deitadas no gramado, com os focinhos esbarrando na grama, o que permitia que as duas colocassem as patas dianteiras nos ouvidos; e Valsa, a cadelinha, dançando no centro da circunferência de ladrilhos, onde se encontra desenhado o símbolo yin e yang, ao som do jingle das candidatas a deputadas federal e estadual, que mais estão investindo nos eleitores de Mairinque (para não dizer “que mais estão enchendo o nosso saco”).

Salsa, com cara de poucos amigos, gritava pra Valsa parar de dançar aquela música horrível. “Não é a dança, é a música que tem que parar.”, gritava Samba, demonstrando extrema irritação. De fato, eu e Lisa concordamos, silenciosamente, que a dança não estava ruim. Aliás, cá entre nós, a Valsa estava uma gracinha. Ela fazia uns passos difíceis em duas patas, alternando dianteiras e traseiras, e conseguia desenhar um movimento com a cabeça e outro com a calda, que nos deixou extáticos.

Vendo que Salsa e Samba poderiam ter um treco, Maracatu e Lambada saíram pulando pelos muros da redondeza até sumirem.

E a música continuava e Valsa cada vez mais empolgada com os novos passos que inventava. E Salsa e Samba cada vez mais irritadas. Não sei dizer se o Tom estava gostando ou não, porque ele começou a pular de pilar em pilar, além de se equilibrar na grade existente entre eles. De repente o som parou e foram parando todos os outros que estavam abafados pelo volume do jingle das candidatas, até que se ouviam apenas os pregões dos feirantes.

Valsa parou se equilibrando em apenas uma das patas dianteiras, com as traseiras para o alto e olhando em direção de Samba e Salsa, que tiraram as patas dos ouvidos e aplaudiram. Tom voltou para um dos pilares e Maracatu e Lambada chegaram alguns minutos depois limpando as mãos. “Acho que eles vão demorar um tempão para descobrirem o defeito no som de seus carros.”, disse Lambada, escondendo um sorriso no olhar.

“Ah! Foram vocês que pararam o som? Tava tão gostoso.”, reclamou Valsa. “Outro dia você tava dançando uma música tão bonita do Milton Nascimento, que eu até me emocionei, mas dançando essa porcaria eu não acho legal. Parece meio vulgar.”, falou, com bastante calma, a Samba. “O pior é que esses jingles são plágios.”, informou Lambada. “Não pode ser Lambada! Plágio é crime e as candidatas não cometeriam um crime em plena campanha. Principalmente elas, que estão querendo ser deputadas.”, argumentou Salsa. “O que é plágio?” perguntou Valsa. “No caso desse jingle, as candidatas pegaram uma música que faz sucesso e colocaram uma letra que fala bem delas. Se elas não tem autorização do compositor da música, estão cometendo o crime de uso indevido de uma propriedade intelectual.”, explicou Tom. “Falou bonito, Tom!”, brincou Maracatu, que completou ironizando, “as futuras deputadas começam dando ótimos exemplos, caso não tenham a autorização”.

“Eu não sabia que era música de campanha eleitoral. Pensei que era a propaganda de novas bonecas, tipo Barbie.”, revelou Valsa, após uns bons goles de água. “Não é muito diferente disso.”, disse Salsa, concluindo com uma convocação. “Maracatu e Lambada, vamos precisar de vocês no próximo domingo.”

João Bid

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

DESMATAMENTO NO HORTO FLORESTAL

“Aqui, a destruição do meio ambiente começou na década de 70, do século passado, quando começamos a abandonar o Horto, a represa Itupararanga, a Estação Ferroviária e tudo que tínhamos de mais bonito e valioso, para cuidarmos da industrialização.”, falei à Lisa, numa de nossas conversas diárias e matutinas. Falávamos sobre a notícia que dava conta de mais uma devastação de eucaliptos na cidade de Mairinque. Desta vez, no Parque Municipal do Horto Florestal Antonio Anselmo. O cúmulo do paradoxo.

Lamentávamos o fato e buscávamos explicações, quando Maracatu, o saci macho, ainda do lado de fora da casa, não agüentou e pediu licença para entrar e interferir na conversa. “É simples! Desconhecimento histórico de quem deu a ordem para cortar os eucaliptos”, disse ele.

A Lisa, que é licenciada em história e gostou da intervenção, perguntou qual era a relação nesse caso.

“Quem deu a ordem deve estar apoiado naquela teoria que coloca o eucalipto como uma vegetação menor e até prejudicial ao solo, porém, se esquece que Mairinque tem origens na ferrovia.”, ensinou o saci. “E o que a ferrovia tem a ver com o corte de eucaliptos?”, perguntou Samba, que estava deitada no tapete, que fica na porta da cozinha. “Com o corte, nada, mas sim com o plantio. A madeira era o combustível usado pelas locomotivas, por isso, a antiga Estrada de Ferro Sorocabana criou hortos florestais em várias cidades por onde a ferrovia passava.”, respondeu Maracatu.

Salsa, que estava sob a janela da cozinha, degustando um pedaço de pão, tinha tudo pra não entrar na conversa, mas acabou não resistindo. “Você bem disse, Maracatu. A madeira era o combustível; não é mais; então, nada impede que seja cortada.”, ironizou a cadela. Maracatu, um pouco irritado, continuou, “Ainda não entrei no caso do corte em si, estou primeiro historiando. O Horto Florestal de Mairinque é um caso especial, porque ali funcionava uma espécie de laboratório, já que foram plantadas várias espécies de eucalipto com o objetivo de se chegar no apropriado para a utilização deste como combustível. Por isso, aliás, é que Mairinque era comparada a Campos do Jordão. O ar daqui era muito bom para tratamento de algumas doenças respiratórias, porque os eucaliptos garantiam essa qualidade.”, concluiu Maracatu.

Tom, o gato, estava dormindo no pufe e, vez ou outra, abria os olhos como que pedindo para a conversa manter um nível de volume aceitável, mas percebia-se que, mesmo sonolento, estava entendendo o rumo da discussão. Quem não estava entendendo, era a Valsa, a cadelinha mais nova. “Tudo bem, essa história é muito bonita, mas o que tem a ver com os cortes dos eucaliptos?”, perguntou ela. “Tudo a ver...”, respondeu Lambada, a saci, que até ali, se mantinha muito atenta, continuando, “alguém que conhece essa história, que sabe da importância dessa árvore na criação deste município, jamais se arriscaria a passar pela vergonha de autorizar essa devastação. Aliás, essa pessoa não deve nem conhecer o Hino Oficial de Mairinque. Se conhecesse, não daria a ordem, pois imaginaria que não foi de graça que os autores do hino colocaram um papel de destaque para os eucaliptos naquela letra.”, ressaltou Lambada.

“Parabéns Maracatu! Parabéns Lambada! Realmente perfeita essa análise.”, sentenciou a Lisa, que completou: “E, mais uma vez, a falta de investimentos na cultura acaba gerando conseqüências lamentáveis e altamente prejudiciais para uma comunidade inteira.”

“E vocês, que estão aqui desde a década de 60 do século passado e vivem falando de investimentos na cultura e nas artes, não fizeram nada?”, perguntou a Salsa. “Salsa! Você já ouviu alguém falando que pregou no deserto?”, perguntou o Tom, com a voz um pouco rouca, por conta de um pigarro, natural em quem acaba de acordar. Salsa, se dirigindo para o quartinho, gritou que sim. “Pois é! Acho que esse é o caso.”, concluiu o gato. “E se não derem um basta nessa devastação, os mairinquenses vão acabar pregando no deserto, literalmente.”, profetizou a Samba, também gritando, pois acompanhava a Salsa.

Terminamos ali nossa conversa, mas ainda deu tempo de ouvir a Valsa, correndo atrás das outras cadelas, quase na porta do quartinho, perguntar pra Samba: “Se Mairinque virar um deserto, você não acha que as pessoas vão querer criar camelos e a gente acaba perdendo nosso espaço?”. Samba não respondeu, mas balançou a cabeça e sorriu.

João Bid

quinta-feira, 24 de junho de 2010

JOSÉ SARAMAGO

Silêncio, por favor!

João Bid

terça-feira, 15 de junho de 2010

CASTIGO

No início da semana, no trabalho, eu, Chiquinho e Wagner conversamos sobre as dificuldades de se criar um filho nestes tempos, porque, se descuidar, os filhos acabam determinando os rumos da coisa e você termina refém. O Chico tem dois filhos homens e uma menina e o Wagner um casal. Como não tenho filhos, acabei mal comparando com a minha situação de refém das minhas cadelas, meus sacis e meu gato.

Nós três trabalhamos juntos e dividimos o mesmo espaço há vinte anos, porém, pelas características de cada um, convivemos muito bem e penso até que daria para ficar mais uns vinte anos juntos. Nos divertimos muito, filosofamos, nos indignamos, sem esquecer da questão do trabalho, que, por incrível que possa parecer para quem nos conhece, tocamos com muita seriedade.

Mas, falávamos sobre a força das crianças e a personalidade de alguns jovens e adolescentes, que conseguem dominar e comandar uma família (não é o caso de nenhum dos dois). Nossas opiniões são diferentes, mas não divergentes. Eu, para variar, acho que falta cultura, aqui representada por seu braço mais forte: a arte.

Um dia depois, ao chegar de São Roque, onde dá aulas e dirige um grupo de teatro formado por adolescente, a Lisa me contou que o pai de uma das alunas a proibiu de se apresentar com o grupo num evento, como forma de castigá-la, porque esta havia cometido uma falta qualquer na escola.

Diante da coincidência, contei a conversa que tive no trabalho e elogiei o fato de a aluna da Lisa ter obedecido o pai, argumentando que uma menina que faz teatro entende com mais facilidade o que significa o respeito pelo pai. “É a arte!”, comemorei.

“É! Mas foi exatamente a arte que o pai pensou em cortar como forma de castigar a menina.”, disse o Tom, em cima do pufe, de onde acabara de acordar, ainda meio bocejando. “Eu ia dizer isso.”, se manifestou a sempre muito sensível Lambada. “Acho que são saudáveis esses castigos. É preciso fazer com que o adolescente sinta que cometeu uma falta, por isso, é importante que os pais os impeçam de fazer algo que gostam.”, disse eu, pensando no papo que tive com meus amigos. “Concordo. Mas precisava ser o teatro, já que, como você mesmo disse, foi o próprio teatro que ensinou a menina a respeitar o pai?”, argumentou Maracatu. A Lisa abriu um sorriso irônico, que normalmente me irrita, mas desta vez, entendi que havia uma incoerência na minha fala. Olhei para o tapete, onde se encontravam Samba, Salsa e Valsa, em busca de apoio. “Acho melhor colocar a Valsa no teatro, ou na música, pra ver se ela acalma um pouco”, disse a Samba. A Salsa nem precisava dizer nada. Seu olhar era mais irônico que o riso da Lisa. “Quero fazer dança!”, disse a Valsa, já esticando as patas dianteiras para o alto e dando um rodopio.

“O pai poderia ter cortado duas semanas de internet.”, disse a Salsa; “ou três finais de semana de baladas”, disse a Samba; “ou dois meses sem beijar o namorado”, disse a Valsa. Inevitável! Todos riram.

Assumi minha incoerência e ficamos nos questionando sobre a necessidade de fazer as crianças e os adolescentes terem contato com as artes, mas de forma muito séria e não somente como uma forma de ocupar seus tempos. “Ainda vai demorar um pouco pra entenderem isso, principalmente o poder público.”, concluiu Lambada.

A Lisa quis continuar no tema e ressaltou o ambiente isento de preconceitos no mundo das artes, o que, em sua opinião, contribui ainda mais para a formação de verdadeiros cidadãos. “Sem falar na possibilidade de descobrir talentos artísticos.”, lembrou Maracatu. “Tenho absoluta certeza de que entre os adolescentes envolvidos em atos de vandalismo, nenhum está ligado de alguma forma às artes.”, garantiu Lambada, chamando Maracatu para a saída noturna. “Você tem razão. É porque a arte trabalha a sensibilidade da pessoa.”, definiu o Tom, com ar intelectualizado.

Debatemos mais um pouco, concluindo que, mesmo que seja como um trabalho de formiga, devemos insistir diariamente na importância da arte para a formação do ser humano e pedir para os pais, também diariamente, que não castiguem seus filhos tirando a possibilidade do contato deles com as artes.

Mais tarde, quando as cadelas se dirigiam ao quartinho pra dormir, ao passarem pela minha janela, ouvi a Salsa falando pra Valsa: “Tô morrendo de sono. Amanhã, não quero que você acorde cantando.” “Você não entendeu nada, Salsa?”, reclamou a Valsa. “Brincadeirinha... brincadeirinha...”, disse a Salsa, bocejando.

João Bid

quinta-feira, 6 de maio de 2010

SÉCULO 21 SEM COLETA SELETIVA DE LIXO

O Tom quase caiu do muro com o ataque de riso que teve quando falei que Mairinque já foi a quarta arrecadação per capita do Estado e oitava do país.

Tirei o domingo, dia 2 de maio, pra cortar a grama do quintal e conversava com as cadelas, os sacis e o gato, que assistiam meu terapêutico trabalho.

Maracatu, que estava sentado em cima do telhado da lavanderia, junto com a Lambada, tinha acabado de me perguntar o porquê de Mairinque, em pleno século 21, ainda não fazer a coleta seletiva do lixo.

Eu explicava que, hoje, Mairinque não só deveria ter a coleta seletiva como poderia ser uma cidade modelo para o mundo, já que foi, durante mais de trinta anos, a quarta arrecadação per capita do Estado e oitava do Brasil.

“Você tá de brincadeira.”, disse, entre risos, o gato. “O que fizeram com todo esse dinheiro?” perguntou ele, já se equilibrando melhor e voltando à posição original. Omiti a resposta e retomei a discussão sobre a coleta seletiva.

A conversa havia começado, porque a Samba, que estava deitada na grama com a Salsa, foi instigada pela Valsa, a cadela mais nova, a me perguntar sobre os mais de dez sacos de lixo reciclável que estão acumulados em casa. Samba se incomodou com isso, mas não queria me falar, porém, a Valsa, que, ao meu lado, acompanhava o cortador de grama numa marcação “homem a homem”, não agüentou de curiosidade. “Pergunta pra ele!”, disse a cadelinha. “Valsa! Deixa isso pra lá.”, disse a Salsa. Mas a Samba achou melhor tocar no assunto. “Vocês estão com algum problema financeiro?”, perguntou Samba. “Não, por quê?”, respondi perguntando. “Porque faz mais de um mês que o lixo reciclável está se acumulando no quintal, que nós estamos pensando que vocês estão juntando pra vender e arrecadar algum dinheiro.” Acalmei a cadela, falando sobre as dificuldades que a associação dos catadores vem enfrentando para dar conta de pegar o lixo na casa das pessoas que fazem a separação. Aí é que Maracatu fez a pergunta sobre a coleta seletiva.

O Tom continuava admirado com os dados que apresentei. “Ando pelo bairro todas as noites e lamento a situação em que o município se encontra, com suas ruas esburacadas, lixo espalhado por todos os cantos... apesar de que aumenta a quantidade de ratos e os ratos são muito divertidos... mas, eu achava que Mairinque é e sempre foi muito pobre. Nunca poderia imaginar que já foi rica um dia.”, argumentou o gato,

“Não precisa ser uma cidade rica para fazer a coleta seletiva e reciclar o lixo. Isso tem que ser prioridade, você não acha?”, perguntou Samba para mim. Respondi que o maior problema é conseguir que as pessoas que comandam o município entendam isso.

“Elas são tão burras assim?”, perguntou a Salsa, sem muito rodeio. “Não é uma questão de burrice, mas sim...”, quis responder, mas a Salsa me interrompeu, concluindo. “É uma questão de pobreza de espírito”.

Lambada relatou pras cadelas e para o Tom, que ela e Maracatu observaram na cidade as várias pessoas que se juntaram numa associação e sobrevivem do lixo reciclável. Maracatu completou a informação: “Sem qualquer apoio do poder público, apesar das reivindicações da associação”.

“Eles estão pedindo muita coisa?”, perguntou a Valsa pra mim. Respondi que, pelo que soube, eles precisariam de um local, uma prensa e um caminhão. “E isso é muito?”, replicou a Valsa. “Fica caro isso?”, perguntou a Salsa. “Acho que...” comecei a responder, mas fui interrompido por um estouro de uma bomba potente, seguido de várias outras explosões menores.

As cadelas saíram correndo para o quartinho. O Tom quase caiu do muro novamente, mas, desta vez, não riu; ficou assustado e foi correndo pra dentro de casa. Maracatu e Lambada saíram pulando pelos telhados dos vizinhos em direção do local de onde vinham as explosões.

Tudo, em Mairinque, termina com queima de fogos, para desespero dos animais, dos doentes, das crianças e meu. Lembrei-me que estava acontecendo a festa dos trabalhadores e voltei a pensar nos trabalhadores catadores de lixo de Mairinque, que não tinham muito o que comemorar naquele dia.

Mais tarde, Samba latiu na janela do meu quarto pra dizer que estava tudo bem e fazer um pedido.

“Faça alguma coisa pra conseguir o apoio do poder público para os catadores. Eles fazem um trabalho bonito e podem melhorar muito a qualidade de vida da população. Outra coisa. Vamos falar sobre queima de fogos qualquer dia, porque eu não consigo entender a necessidade dos humanos de queimar, literalmente, tanto dinheiro com bobagens e deixar de lado coisas tão importantes, como a coleta seletiva, por exemplo.” Virou as costas e foi cabisbaixo pro quartinho.

João Bid

sábado, 10 de abril de 2010

UM TOM PARA SAMBA, SALSA, VALSA, MARACATU E LAMBADA

Mesmo sob os protestos de Samba, Salsa e Valsa, o Tom foi insistindo, aplicando dribles, se equilibrando no muro, e chegou à varanda. Hoje, ocupa uma das poltronas da sala de estar da nossa casa.

O gato apontava a carinha na coluna da frente de casa e as meninas ficavam loucas. Não paravam de latir. Maracatu e Lambada se posicionavam na janela e ficavam se divertindo com a farra que se armava.

Maracatu e Lambada, aliás, desde o início, sabiam que o Tom venceria essa parada e que, em pouco tempo, assumiria um lugar em nossa casa, como acabou ocorrendo. Os sacis sabem tudo, por isso, eu e Lisa perguntávamos como acabaria toda aquela bagunça, mas eles somente riam e pediam que a gente esperasse. Sabíamos que a ética dos sacis não permite que eles antecipem os fatos, mas ficávamos mais aliviados, porque entendíamos que a reação do casal apontava para um final feliz, porém, não conseguíamos deixar de nos preocupar.

Agora, quando o Tom está dormindo, eu e Lisa falamos sobre a aventura em que se transformou a chegada dele e rimos muito, mas, às vezes, somos interrompidos pela frase: “agora vocês riem, mas bem sabem o sufoco que passei”. É o Tom, com sua voz situada na fresta existente entre as vozes de Caetano Veloso e Seu Jorge. Sabe aquela voz meio macia, que vai do médiograve para o agudo, como a do Caetano, e com a potência, a força e a segurança da voz do Seu Jorge? O olhar é azul, mas traz um semblante sisudo, que sempre deixa a impressão de estar bravo. “Nesse mundo capitalista, a gente não pode ter um olhar ingênuo para não ser enganado”, diz o Tom, se dirigindo a mim, que ando sempre “desarmado”, por isso, exposto a ação dos mais espertos, segundo análise dele.

Todos devem estar curiosos para saber como está e como será o convívio das cadelas e dos sacis com o Tom. Eu e Lisa também estamos. É! Porque as coisas ainda não estão definidas. Maracatu e Lambada tem contribuído muito, já que as meninas, digo, as cadelas ouvem muito os sacis e estes tem conversado bastante sobre esse assunto com elas.

A Lisa me garante que a Salsa e a Valsa já estão apaixonadas pelo Tom e somente a Samba ainda resiste, mas continuo um pouco preocupado.

Chamei a Salsa e pedi sua opinião. A Valsa, que ainda é uma criança, nos interrompeu dizendo “eu acho o Tom lindo...”. “Espere um pouco Valsa.”, chamando a atenção da Valsa, disse a Salsa. “Nos vamos atrás da Samba, quando ela corre atrás do Tom, porque não deixo minha irmã sozinha nunca. Acho que temos que nos manter unidas.”, disse a Salsa, que se virou e perguntou, “não é Valsa?”. A Valsa, olhando pra mim e falando um pouco mais baixo, “É! Mas nós não podemos negar que o Tom é lindo”. “Não é disso que estamos falando”, definiu a Salsa, olhando firme para Valsa.

Conversei com a Samba em particular e ela me explicou que seu instinto se sobrepõe e ela não pode fazer nada. “Como a própria palavra quer dizer, instinto é algo que domina a razão e quando cismo de correr atrás do Tom, nada me segura”, me disse a Samba numa dessas conversas. Nesse dia, aliás, fiquei bastante animado e, ao mesmo tempo, com pena da Samba, porque senti que ela tem lutado contra seu instinto. Percebi que lá no fundo ela também começa a se apaixonar pelo Tom. Se já não estiver.

Se mantendo distante dessa negociação, Tom se mostra muito seguro ao dizer que não abre mão do espaço que conquistou e, além dos risos que nos provoca, nos deixa mais confiantes quando diz: “Fiquem tranqüilos, meu destino era este, vou dar o tom para esses ritmos todos que vocês tem aqui. Mais cedo ou mais tarde, vou conquistar as meninas.” Vira-se e volta a dormir.

João Bid

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

APÓS TRÊS ANOS, MUITAS NOVIDADES!

Fiquei três anos sem escrever sobre os papos com minhas cadelas e meus sacis, portanto, muitas coisas mudaram de lá pra cá. Pra variar, mudamos de casa mais uma vez e, agora, além das irmãs Samba e Salsa, agregamos à família mais uma cadela, a Valsa, e, a grande novidade, o Tom, um gato siamês que “foi chegando sorrateiro e, antes que disséssemos não, se instalou feito um posseiro dentro do nosso coração”. A quantidade de sacis não aumentou e acho que por influência minha e da Lisa. O casal argumenta que fez a opção por não ter filhos, porque não se sente competente para criar sacizinhos, além de entender que é preciso melhorar este mundo para depois gerar um novo ser. Mais ou menos o que eu e Lisa pensamos sobre o tema, além de, é claro, colocarmos nossas artes como prioridade.

Com relação aos animais, passado o estresse inicial, tudo vem caminhando muito bem. A Valsa chegou para nós em maio de 2009, com apenas 5 meses, para conviver com duas irmãs gêmeas de 9 anos e com o casal milenar de sacis. Sabíamos que a relação seria difícil e notamos logo nos primeiros dias.

A Lisa, em conversa com a Samba e com a Salsa, na presença de Maracatu e Lambada, antes da vinda da Valsa, explicou que queria trazer uma cadelinha pra casa porque são muitos os animais que estão em instituições na expectativa de serem adotados e ela, Lisa, entendia que seria muito interessante ter uma novidade em casa. A Salsa ouviu e, como costuma fazer, quis dar um tempo para pensar melhor e não se manifestar abruptamente; diferentemente da Samba, que ficou toda ofendida e foi para o quartinho chorando. Lambada, que ouvira e se entusiasmara com a idéia, foi atrás da Samba para tentar convencê-la.

“Eles não estão felizes com a gente. Acho que é porque estamos ficando velhas.”, disse a Samba para Lambada, que foi decisiva na resposta. “Samba! Você é testemunha da quantidade de cães sem dono existentes nas ruas. Eles passam o dia inteiro pela nossa casa. Sei que você tem um grande coração e vai acabar achando bacana a vinda de uma cadelinha pra cá. Pense que o ambiente pode ficar muito interessante com essa novidade. E você e a Salsa podem adotá-la como a filha que nunca tiveram”. Nesse momento Samba se aquietou e pediu pra ficar sozinha. Lambada foi até a varanda e nos contou o diálogo. Salsa já havia se convencido e estava feliz com a vinda da cadelinha.

Quinze minutos depois, aparece a Samba na varanda. “Me perdoem, mas me sinto insegura diante de situações novas.”, disse Samba, que completou, “Admito também, que sou um pouco egoísta e reajo mal quando me sinto ameaçada.” Em seguida, colocou um sorriso no focinho e determinou: “Vamos começar os preparativos para receber a Valsa. Isso mesmo! Faço questão de escolher o nome.”

Uma semana depois, chegou a Valsa. É! Acatamos a “sugestão” da Samba.

No auge de sua infância e com o gás todo, Valsa entrou no quintal e, sem se intimidar com a presença de Samba e Salsa, passou o fazer o reconhecimento do espaço, correndo por todo o gramado num ritmo frenético como há muito não se via em casa. Salsa foi para um canto, como de praxe, esperar o agito inicial e tentar entender a personalidade daquela “menina”. Ela, a Salsa, parecia um daqueles cowboys, que coloca um fiapo de grama na boca e fica de cócoras olhando para o horizonte, na espera do ataque dos índios (Quem tem mais de quarenta anos vai entender a comparação). Samba não tirava os olhos da Valsa, querendo acompanhar a correria e até entrar nela, se houvesse uma brecha. Maracatu e Lambada entraram na brincadeira, um puxando o rabo da Valsa, outro colocando obstáculos pra que a Valsa desviasse. Foi assim, até que a Valsa resolveu conhecer suas novas companheiras. No primeiro contato, a Salsa deu um chega pra lá, mas a Samba foi mais receptiva e ali começava essa relação, com alguns arrancarrabos vez ou outra, mas tudo dentro do normal.

A coisa ficou diferente, quando, cinco meses depois, chegou o Tom. Mas essa história merece um outro artigo.

João Bid