A Salsa morreu. Ontem, perto das quatro
horas da tarde. Por mais que a gente pense que está preparado, não está. E
ninguém está. Todos em casa estão tristes.
O segundo nome da Salsa é Filomena: Salsa Filomena;
porque descobrimos que São Filomeno é protetor dos músicos, dos comediantes e
dos Palhaços. Sou músico e a Lisa adora palhaços, pesquisa essa arte, então era
esse o segundo nome. Santa Filomena é protetora dos estudantes. Também fica
bom.
Por ironia do destino, a Salsa morreu nas
mãos de um veterinário-músico. Zé Penone foi flautista do Catavento. Aliás, foi
ele quem gravou as flautas no nosso primeiro disco: um vinil, com três faixas,
chamado “Disco”. Até hoje, acho a sopro do Zé um dos mais bonitos que ouvi, mas,
infelizmente, raras vezes nos encontramos no palco. Acabei ficando sem um
grande músico, mas ganhei um excelente veterinário. Amigo, antes de qualquer
coisa.
Eu estava falando sobre isso com a Valsa e
com a Rumba, sob os olhares de Maracatu e Lambada. A Samba estava recolhida na
casinha que ultimamente era mais utilizada pela Salsa. A Lisa estava dentro de
casa. Entendi que ela preferiu não falar sobre o assunto até passar um pouco
essa dor.
Valsa e Rumba me pediram para contar
algumas curiosidades da vida da Salsa. Maracatu e Lambada ficavam me ajudando a
lembrar. Algumas eu até contei por aqui e outras foram surgindo e a gente foi
relaxando.
Lembrei-me de quando a Samba e a Salsa
chegaram pra mim. Eu morava sozinho e era “marinheiro de primeira viagem” com
relação à adoção de animais. Eu fiquei uns quinze dias sem comer direito, pois
estava sempre achando que alguma coisa estava errada com as duas. Preocupação
besta de quem não tem experiência. Um dia, o PT de Mairinque, que sempre foi um
grupo de amigos antes de ser um partido político, se reuniu para a troca de
presentes, numa brincadeira de amigo secreto. Eu e Lisa acabamos não indo,
porque a Salsa havia tomado uma picada de abelha e estava com a pata inchada.
Aquilo me deixou apavorado e nem fui à festa, sendo alvo de muito sarro e
críticas por parte dos “companheiros”.
“Elas aprontavam muito? Mais que a Valsa e
a Rumba?”, perguntou a Lambada. Disse que passei muito sufoco e lembrei que elas
quase destruíram minha casa. “Imaginem duas cadelinhas de dois meses, soltas na
sala da casa? Estragaram o tapete, riscaram os móveis, comeram o braço da
namoradeira e por aí vai.”, contei. “Então não era muito diferente das duas
aqui.”, disse Maracatu. “Eu não apronto nada.”, afirmou a Rumba. Valsa apenas sorriu
entre os dentes e cantou: “Samba e Salsa rolando na Sala, quem dança sou eu.
Pede pra parar... pede pra parar... pede pra parar.”; uma composição que
dediquei a elas.
No fim da conversa, disse a Rumba, com a
inocência que ainda lhe é peculiar: “É até bonito pensar que a Salsa deu seu
último sopro de vida nas mãos da pessoa que tem um bonito sofro de flauta.”,
sendo completada pela Valsa: “O veterinário fez tudo para mantê-la viva, mas,
num determinado momento, saiu o veterinário e entrou o flautista para
conduzi-la a um novo mundo. E a música deve ter sido linda.” Silenciamos todos.
Naquela noite, não pude deixar o
compromisso de cantar e, dentro de mim, cantei a noite inteira para a Salsa. Mas
no fim, não resisti e falei que iria encerrar cantando uma música para a Salsa.
E cantei a música “MEU SILÊNCIO”, de Cláudio
Nucci e Luiz Fernando Gonçalves. Sei que a Salsa pediria para eu aconselhar os
leitores a ouvir a música. Então, deixo a letra abaixo e peço que procurem
ouvi-la. Tem uma gravação linda, da Nana Caymmi, no Youtube.
Velho(a) companheiro(a)
Que saudade de você
Onde está você?
Choro neste canto a tua ausência
Teu silêncio
Que saudade de você
Onde está você?
Choro neste canto a tua ausência
Teu silêncio
E a distância que se fez tão grande
E levou você de vez daqui
E levou você de vez daqui
Sabe, companheiro(a)
Algo em mim também morreu
Desapareceu junto com você
E hoje este meu peito mutilado
Bate assim descompassado
Que saudade de você
João
Bid
Sua postagem muito me emocionou, pois quem de nós já não perdeu um cachorro querido e sentiu a tristeza de não tê-los mais por perto.Porém sempre ficam as lembranças gravadas em nossa mente e coração. Logo esta dor virará uma saudades gostosa. Vai passar. Um grande beijo.
ResponderExcluirJoão, nada mais importante que ter vivido ao lado de seres inesquecíveis, que despretensiosamente nos ensinar muito a ser o que deveriamos nunca ter deixado de ser: sinceros e espontâneos. Aposto tudo que a Salsa lhe deu e ensinou isso. beijos
ResponderExcluirJoão,
ResponderExcluirEla com certeza viveu tão bem ao lado de vocês que deve ter ido muito feliz.
Foi muito abençoada este tempo todo, até o final, linda passagem do vet flautista, do sopro da flauta e sopro de vida.
Beijos e abraços em vocês, lambidas na turma toda, parabéns por tê-la feito tão feliz.
JoãoBid, reencontrei seu texto sobre o adeus a Salsa (estava reativando meu blog sobre futebol pensando sobre o desafio do meu Palmeiras...) quando reli, justamente, porque estamos perdendo a Buffy (minha boxer) companheira por mais de 12 anos e agora muito doente. Vamos tentar estar vivos até o "último sopro", pois ela sempre será minha primeira-cadela. Um VIVA pra elas!
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