quinta-feira, 6 de maio de 2010

SÉCULO 21 SEM COLETA SELETIVA DE LIXO

O Tom quase caiu do muro com o ataque de riso que teve quando falei que Mairinque já foi a quarta arrecadação per capita do Estado e oitava do país.

Tirei o domingo, dia 2 de maio, pra cortar a grama do quintal e conversava com as cadelas, os sacis e o gato, que assistiam meu terapêutico trabalho.

Maracatu, que estava sentado em cima do telhado da lavanderia, junto com a Lambada, tinha acabado de me perguntar o porquê de Mairinque, em pleno século 21, ainda não fazer a coleta seletiva do lixo.

Eu explicava que, hoje, Mairinque não só deveria ter a coleta seletiva como poderia ser uma cidade modelo para o mundo, já que foi, durante mais de trinta anos, a quarta arrecadação per capita do Estado e oitava do Brasil.

“Você tá de brincadeira.”, disse, entre risos, o gato. “O que fizeram com todo esse dinheiro?” perguntou ele, já se equilibrando melhor e voltando à posição original. Omiti a resposta e retomei a discussão sobre a coleta seletiva.

A conversa havia começado, porque a Samba, que estava deitada na grama com a Salsa, foi instigada pela Valsa, a cadela mais nova, a me perguntar sobre os mais de dez sacos de lixo reciclável que estão acumulados em casa. Samba se incomodou com isso, mas não queria me falar, porém, a Valsa, que, ao meu lado, acompanhava o cortador de grama numa marcação “homem a homem”, não agüentou de curiosidade. “Pergunta pra ele!”, disse a cadelinha. “Valsa! Deixa isso pra lá.”, disse a Salsa. Mas a Samba achou melhor tocar no assunto. “Vocês estão com algum problema financeiro?”, perguntou Samba. “Não, por quê?”, respondi perguntando. “Porque faz mais de um mês que o lixo reciclável está se acumulando no quintal, que nós estamos pensando que vocês estão juntando pra vender e arrecadar algum dinheiro.” Acalmei a cadela, falando sobre as dificuldades que a associação dos catadores vem enfrentando para dar conta de pegar o lixo na casa das pessoas que fazem a separação. Aí é que Maracatu fez a pergunta sobre a coleta seletiva.

O Tom continuava admirado com os dados que apresentei. “Ando pelo bairro todas as noites e lamento a situação em que o município se encontra, com suas ruas esburacadas, lixo espalhado por todos os cantos... apesar de que aumenta a quantidade de ratos e os ratos são muito divertidos... mas, eu achava que Mairinque é e sempre foi muito pobre. Nunca poderia imaginar que já foi rica um dia.”, argumentou o gato,

“Não precisa ser uma cidade rica para fazer a coleta seletiva e reciclar o lixo. Isso tem que ser prioridade, você não acha?”, perguntou Samba para mim. Respondi que o maior problema é conseguir que as pessoas que comandam o município entendam isso.

“Elas são tão burras assim?”, perguntou a Salsa, sem muito rodeio. “Não é uma questão de burrice, mas sim...”, quis responder, mas a Salsa me interrompeu, concluindo. “É uma questão de pobreza de espírito”.

Lambada relatou pras cadelas e para o Tom, que ela e Maracatu observaram na cidade as várias pessoas que se juntaram numa associação e sobrevivem do lixo reciclável. Maracatu completou a informação: “Sem qualquer apoio do poder público, apesar das reivindicações da associação”.

“Eles estão pedindo muita coisa?”, perguntou a Valsa pra mim. Respondi que, pelo que soube, eles precisariam de um local, uma prensa e um caminhão. “E isso é muito?”, replicou a Valsa. “Fica caro isso?”, perguntou a Salsa. “Acho que...” comecei a responder, mas fui interrompido por um estouro de uma bomba potente, seguido de várias outras explosões menores.

As cadelas saíram correndo para o quartinho. O Tom quase caiu do muro novamente, mas, desta vez, não riu; ficou assustado e foi correndo pra dentro de casa. Maracatu e Lambada saíram pulando pelos telhados dos vizinhos em direção do local de onde vinham as explosões.

Tudo, em Mairinque, termina com queima de fogos, para desespero dos animais, dos doentes, das crianças e meu. Lembrei-me que estava acontecendo a festa dos trabalhadores e voltei a pensar nos trabalhadores catadores de lixo de Mairinque, que não tinham muito o que comemorar naquele dia.

Mais tarde, Samba latiu na janela do meu quarto pra dizer que estava tudo bem e fazer um pedido.

“Faça alguma coisa pra conseguir o apoio do poder público para os catadores. Eles fazem um trabalho bonito e podem melhorar muito a qualidade de vida da população. Outra coisa. Vamos falar sobre queima de fogos qualquer dia, porque eu não consigo entender a necessidade dos humanos de queimar, literalmente, tanto dinheiro com bobagens e deixar de lado coisas tão importantes, como a coleta seletiva, por exemplo.” Virou as costas e foi cabisbaixo pro quartinho.

João Bid

5 comentários:

  1. Olá meu amigo, saiba que já sou seu seguidor.
    parabéns pelo texto, muito interessante e prende mesmo esses personagens, qualquer dia vou querer conhece-los.
    abrção!

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  2. Tenho muito orgulho dos nossos bichos tão sensíveis e inteligentes...
    Nesse momento, acabei de colocar mais um saco de lixo reciclável na "pilha" e a Samba me olhou de um jeito esquisito...

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  3. Muito bom João! Isso ainda vai dar um livro porque não vislumbro mudanças tão cedo no poder público...

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  4. OI MEU QUERIDO SDS, SABE A TEMPO RECEBI O CONVITE PARA VISITAR O SEU BLOG,NÃO APAGUEI O CONVITE DESDE ENTÃO, POIS SABIA QUE UM DIA FARIA ISSO,PODERIA TE DAR TANTAS DESCULPAS QUE ACREDITO SEREM VERDADEIRAS, MAS A VERDADE É QUE HOJE EU LI SUAS LINHAS E ME EMOCIONEI, AI ME DEI CONTA PORQUE SINTO TANTA NOSTALGIA, SINTO FALTA DE CONVERSA JOGADA FORA, TANTA RISADA, ENTRE BRINCADEIRAS A CONVERSA SÉRIA, OS CONTOS E OS CAUSOS,E DESCOBRI QUE EU SOU FELIZ E SEMPRE SOUBE DISSO.
    COM MUITO ORGULHO DE PODER DIZER, DE SUA AMIGA COM CARINHO
    BJSSSSS

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