sábado, 23 de fevereiro de 2013

CHEGA DE TRISTEZA

Faz mais ou menos sete meses que não escrevo aqui. Não por falta de assunto, já que muita coisa aconteceu nesse tempo, umas ótimas, outras muito ruins, mas a falta de ânimo me atacou depois de mais algumas perdas.
As últimas foram as de Adriano Stuart e Magro Waghabi. Adriano adorava o vocal do Catavento, desde os tempos de Kiko e Chico. Ele dirigia o programa “Som Brasil”, da Globo,  na década de 90, e nos levou diversas vezes para nos apresentarmos lá. Era nosso grande amigo, com quem passamos muitas noites em botecos paulistanos. Magro, era do MPB4, grupo vocal que serviu como inspiração para o início da carreira do Catavento, e seu principal arranjador vocal durante mais de 40 anos. Uma vez, no fim da apresentação do show “Adonirando”, do Catavento, no Mistura Fina, um espaço nobre do Rio de Janeiro, vi o Magro na plateia, fui ao seu encontro e perguntei o que ele estava fazendo ali. “Sou fã de vocês.”, disse-me ele. Imediatamente falei que iria buscar um CD para presenteá-lo, mas ele disse que havia comprado, por isso estava ali: “...queria conferir ao vivo o que ouvi no CD”. Foi uma convivência de raríssimos encontros pessoais, mas de constantes contatos virtuais. Ele me deixou a impressão de ter ido antes do combinado, porque estava sempre agitado e toda vez que conversávamos falava-me sobre um novo projeto.
Por último, minha mãe. Para ela, escrevi algo na internet, que reproduzo aqui: O abacateiro do vizinho nasceu muito próximo do vértice que une quatro vizinhos e está completamente carregado. Ontem, a Lisa observou que o abacateiro é muito generoso, porque seus galhos avançam os muros e ele distribui igualitariamente seus frutos entre os quatro vizinhos. Minha mãe era assim. Passou sua vida distribuindo seus frutos entre os quatro filhos que teve. Hoje, olhei para o abacateiro e pensei que a quantidade de abacates do lado da nossa casa era menor que a quantidade que estava para o vizinho do lado, mas acho que o vizinho do lado deve pensar a mesma coisa. Assim somos nós, os filhos. Sempre achamos que nossa mãe reserva sua melhor parte para outro irmão, ou irmã. Minha mãe se foi, mas o abacateiro está lá. E ambos continuam nos oferecendo seus exemplos.”
“Chega de tristeza!”, falou a Samba, segurando no meu braço e impedindo-me de estender uma peça de roupa que eu acabara de tirar da máquina de lavar. “Não, Samba. A música do Tom e do Vinícius chama-se Chega de Saudade”, informei à minha cadela mais velha. “O que eu tenho a ver com essa conversa?”, perguntou o Tom, meu gato, que vinha em direção à lavanderia. Expliquei que eu estava falando da música do Tom Jobim com o Vinícius de Moraes. “Vai, minha tristeza e diz a ela...”, cantarolei. “Eu disse chega de tristeza nesta casa. Não estava falando da música.”, reforçou a Samba. “Concordo.”, interferiu a Valsa do meio do gramado, onde tentava se livrar das brincadeiras da Rumba. “Vai, nossa tristeza...”, cantarolou a Rumba. "O que quero dizer, é que muitas outras coisas, e boas, aconteceram pra gente e está na hora de levantar esse astral.", insistiu a Samba.
"Você poderia começar escrevendo uma crônica, bem humorada, sobre a renúncia do Papa Bento XVI.", disse Lambada, a saci, que aparecera entre as folhas do abacateiro. "Benedicto XVI!", corrigiu Maracatu, seu marido, também do abacateiro. "Crônica bem humorada sobre Benedito XVI? Sobre um assunto tão sério como esse?", questionou Samba. "Acho que é uma grande idéia, porque você poderia brincar com o fato de no Brasil, e só no Brasil, o Papa ser chamado de Bento.", disse-me Valsa, colocando uma interrogação na cabeça de todos, inclusive na minha. "É verdade. Bento não é o mesmo que Benedito, no entanto, o Brasil chama o Benedito de Bento.", concordou Lambada.
Lembrei-me que estava com a TV ligada quando um dos cardeais anunciou o nome do novo papa e que também tomei um susto ao ouvir o cardeal anunciando Benedicto XVI e dali a alguns minutos a Globo já o chamava de Bento. Aquilo me chocou, mas com o tempo fui me acostumando. Agora, com esse alerta da Valsa, me voltou à cabeça aquele momento e perguntei se alguém ali tinha alguma opinião sobre o porquê dessa mudança de nome, quando era mais simples e óbvio chamar o Papa de Benedito.
"Acho que é porque soa melhor.", arriscou a Samba. "Acho que ficaram com medo que começassem a chamá-lo de Dito.", falou Tom. "Não quero pensar que seja por preconceito.", falou Rumba, que tem os pelos quase que totalmente pretos.
Instalou-se um silêncio, que foi quebrado por Maracatu: "É melhor não escrever sobre isso.".
Eu havia gostado do tema, mas concordei com Maracatu. Se eu resolvesse escrever sobre isso, iria chegar, inevitavelmente, na questão do Santo Negro Benedito e teria que me aprofundar nas críticas. Quando estiver inspirado, volto a escrever e escolho um tema menos polêmico. 

João Bid

Um comentário:

  1. Belezura de crônica João Bid. Semanas atrás, preocupado com minha mãe (uma cirurgia que não ocorreu) sonhei com o Abê e ele estava no palco cantando com vcs. É isso, bora escrever, chega de tristeza porque a saudade é da vida. Abs

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